Museu americano se vê obrigado a cobrir vitrines que reúnem peças indígenas para não ser penalizado

Arqueólogos e gestores argumentam que nova regra, exigindo consentimento antes de expor objetos, passa dos limites e fere autonomia com acervo

Por Julia Jacobs e Zachary Small Em The New York Times

O Field Museum, de Chicago, encobriu esta semana várias vitrines que apresentam itens culturais de indígenas americanos. Foi uma resposta às novas regulamentações federais dos EUA que exigem que os museus obtenham o consentimento das tribos antes de exibirem objetos ligados à sua herança cultural.

Museus dos EUA têm se preparado para os novos regulamentos, que já entraram em vigor, com autoridades consultando advogados enquanto curadores se esforçam para ler regras que influenciarão a contratação de pessoal e os orçamentos nos próximos anos.

O governo federal revisou as regras que foram estabelecidas na década de 1990, na esperança de acelerar a repatriação de restos mortais e patrimônio cultural de nativos americanos — um processo que as autoridades tribais e os defensores da medida há muito criticam por ser lento.

Processo longo
A decisão do Field Museum está relacionada a uma disposição que exige que as instituições “obtenham consentimento livre, prévio e informado” das tribos antes de exibir itens culturais ou restos humanos, ou permitir pesquisas sobre eles.

Os museus tiveram que decidir se deixariam objetos nativos em exibição e, assim, correrem o risco de violar as novas regras, ou se removeriam os objetos enquanto se engajavam no que poderia ser um longo processo de solicitação de consentimento tribal.

A decisão do Field Museum, anunciada esta semana em seu site, aplica-se a vitrines em seus salões das Américas antigas, focadas em civilizações do Hemisfério Ocidental que abrangem 13 mil anos, e em um salão com cerca de dez nações nativas do Pacífico.

“Aguardando consulta às comunidades representadas, cobrimos todos os espaços que acreditamos conterem itens culturais que possam estar sujeitos a estes regulamentos”, disse o museu em comunicado, que observou que não exibe restos mortais humanos.

Muitas instituições que exibem itens culturais dos nativos americanos, incluindo o Museu Americano de História Natural em Nova York e o Museu Peabody de Arqueologia e Etnologia da Universidade de Harvard, não anunciaram como as suas exposições serão afetadas.

— Está claro como o dia: eles precisam ajeitar tudo se não estiverem de acordo (com o regulamento) — disse Shannon O’Loughlin, diretora executiva da Associação para Assuntos Indígenas Americanos, organização sem fins lucrativos que auxilia nações indígenas.

Parte da nova urgência em torno da repatriação foi alimentada por um esforço mais amplo de museus e universidades para corrigir erros históricos. As posses de restos mortais de nativos americanos estão frequentemente ligadas a roubos de sepulturas, escavações arqueológicas e cemitérios.

Restos mortais
Outro incentivador desse processo tem sido o governo do presidente Joe Biden, que tem tentado encontrar formas de acelerar o repatriamento desde 2021. Restos mortais de mais de 96 mil indivíduos indígenas americanos continuam a ser mantidos em instituições como grandes museus e sociedades históricas locais.

Os novos regulamentos põem fim a algumas práticas que os defensores da repatriação consideram responsáveis por atrasar o processo. As instituições já não podem rotular os restos mortais como “culturalmente não identificáveis”, uma categoria que tornou mais difícil para as tribos fazerem reivindicações sobre essas propriedades.

O Field Museum, fundado em 1894, está entre os museus que renovaram seus compromissos com a repatriação.

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Criadas após consulta a dezenas de tribos indígenas americanas reconhecidas pelo governo federal, as novas regras também procuram abordar preocupações de longa data sobre a consideração que as tribos recebem em relação a exposições e pesquisas.

— Se as pessoas tratassem essa relação com respeito em primeiro lugar, provavelmente não haveria necessidade da regra — disse Bryan Newland, secretário para assuntos indígenas e ex-presidente tribal da comunidade indígena de Bay Mills.

Líderes do mundo dos museus e da arqueologia argumentaram que as novas regras ultrapassam os limites e que os museus devem manter a autonomia na gestão das suas coleções. Se um museu for acusado de não seguir as regulamentações federais, administradas pelo Departamento do Interior, o governo pode emitir uma multa.